Luanda Nera - repórter do Movimento no FSM 2009
A discussão sobre novos indicadores de riqueza vem ganhando espaço em todo o mundo a partir da iniciativa desenvolvida no Butão, país que criou o conceito do FIB (Felicidade Interna Bruta). Alternativas que extrapolem os limitados critérios que definem o mais conhecido indicador de acumulação de capital – o PIB (Produto Interno Bruto) – foram amplamente discutidas durante o Fórum Social Mundial, em Belém. O tema atraiu o interesse de intelectuais, militantes de movimentos sociais e até mesmo de economistas, que buscam uma nova medida de referência para o progresso ou desenvolvimento das nações.
Nesta quinta-feira (29), um debate reuniu grandes nomes como a ex-primeira dama francesa Danielle Mitterrand, o economista Ladislau Dowbor, o filósofo Patrick Viveret e Oded Grajew. Com o tema “Para além do PIB: Por que precisamos de novos indicadores de riqueza?”, o encontro apresentou experiências de criação de novos indicadores que consideram as dimensões sociais, ambientais e culturais, no Brasil e no mundo.
Danielle Mitterrand relatou que a fundação que leva o seu nome foi criada justamente para apoiar iniciativas que visem à construção de outros parâmetros de riqueza. “Estamos juntos para construir outras maneiras de medirmos o conhecimento das pessoas, e não somente o acúmulo do capital. Precisamos, urgentemente, mudar a nossa forma de encarar o dinheiro. E é justamente aqui, no Fórum Social Mundial, que temos a grande chance de construirmos alianças”, defendeu.
Durante sua apresentação, o filósofo Patrick Viveret fez um histórico da construção dos parâmetros que até hoje compõem PIB e foi enfático ao afirmar que o conceito está ultrapassado. “Temos que perceber que o processo de construção dos indicadores do PIB ocorreu num contexto determinado, para uma finalidade específica. Isso foi no período entre a primeira e a segunda guerra mundial. Os políticos da época encomendaram aos estatísticos a tarefa de quantificar a riqueza para que, depois da guerra, fosse possível iniciar a reconstrução. Como resultado, as matérias-primas que serviam à indústria e que alimentavam a guerra foram contabilizadas como as grandes riquezas. Todo o resto não tinha mais valor”, relatou Viveret.
O filósofo francês avaliou que os critérios foram escolhidos em detrimento de outros e que os parâmetros estão defasados: “Essas escolhas foram feitas há mais de 50 anos, o que nos coloca em direção contrária aos grandes desafios do nosso tempo. Mas, agora, depois de um período de desprezo pela sociedade dessas questões, de apatia, as instituições estão voltando a rediscutir a riqueza. Experiências democráticas de construção de novos indicadores são a grande saída”.
Viveret referia-se aos indicadores reunidos pelo Movimento Nossa São Paulo, disponíveis no Observatório Cidadão. Os dados foram apresentados por Oded Grajew durante o debate, que destacou a recente publicação dos “Indicadores Básicos da Cidade de São Paulo”. “Essa é a nossa forma de pressão e de avaliação do poder público. Os indicadores foram propostos pela sociedade, é uma nova forma de se medir o desenvolvimento”, completou Grajew.
O depoimento de Patrícia Galinga, do Equador, mostrou, na prática, como o conceito de riqueza é relativo e pode ser reconstruído. Moradora de um pequeno povoado indígena com cerca de mil habitantes, ela contou como a comunidade conseguiu impedir, no início dos anos 1990, a instalação de uma empresa petrolífera na região, o que poderia provocar danos sociais e ambientais: “Foi muito difícil, tivemos que recorrer a organismos internacionais, enfrentamos exército, mas hoje estamos protegidos por lei. A empresa dizia que, como contrapartida, doaria recursos para projetos sociais. Eles queriam impor o modelo deles de desenvolvimento, mas nós temos o nosso”.
Para os índios, relatou Galinga, riqueza e pobreza têm significados muito diferentes dos nossos: “O indígena pobre é o que não tem o que comer. No mais, não há ricos nem pobres entre nós. Viver bem é viver em harmonia absoluta com a natureza. Para nós, o modelo de riqueza que vocês têm é o que leva à pobreza crônica. Por isso não o queremos”.
Nossa Sao Paulo, 30/01/2009